Monday, October 25, 2004

Fora de jogo

Um dia, alguém decidiu ver João Homem, camisa 8, para lá do limilte legal. Alguém com poder de facto para o fazer. João Homem chama-lhe alguém para não ter de lhe recordar o nome. Só.
Protestou, insultou, disse não cem vezes. Reagiu a quente, ficou um homem frio depois.
Quando decidiu parar para pensar, quando decidiu passar a repetição, nem foi preciso movimento lento. João Homem estava para lá do bom senso, muito distante da honestidade, a jogar em vários campos em simultâneo. E no entanto protestou, insultou, disse não cem vezes.

Sem saber muito como, este Homem viu-se num instante a sombra de tantos homens. Com os vícios de não trazer por casa. Os 40 euros por cada vez no motel, as facturas de deitar fora pelo vidro do carro a quinhentos metros do quarto. E aquele cheiro a que cheiram as outras, aquele que fica colado na pele e preso na roupa. Aquele que incendeia e cega, esse, aquele que se deseja desesperado e que desesperadamente se reza para ir embora.
Ele é Homem para ficar quieto e fingir estar vivo. É Homem para se achar gente apenas por causa da aquele 8 que trás nas costas aos domingos á tarde. Esse 8 que lhe está a moldar a vida, a fazer-lhe a forma de duas curvas em nó. Um caminho sem saída, mas não para ele. O 8 está-lhe preso nas costas e ele já está velho de mais para ver número que anda a fazer.
É Homem para continuar a protestar ou a insultar. Homem para continuar dizer não cem vezes.



1 comment:

António Reis said...

Os Homens são cada vez mais Silvas, Andrades, Martins...e as pessoas estão cada vez menos Homens. E a vida cada vez a ficar mais curta. E cada vez menos gente a dizer Não cem vezes.